sábado, 20 de fevereiro de 2010

O mundo de Lurdes - 3


Alguns leitores andam manifestando-se sobre Lurdes. Um deles até achou que o artigo era propaganda a favor do Lula. Chegou mesmo a me perguntar se eu era filiado ao PT. Por outro lado, uma competente professora de literatura
de Belo Horizonte escreveu me com certo entusiasmo, dizendo que “Lurdes é a cara da maioria do povo brasileiro: explorado, desavisado e, por isso, se deixa enrolar fácil. E o Lula sabe enrolar muito bem”. Outro leitor se identificava
com Lurdes, com medo do futuro, de crises, de falta de trabalho, de escassez
de dinheiro e por isso de muita violência. O mundo de Lurdes comporta
momentos de mau humor e de revolta. Outro dia voltei a puxar conversa com
ela, partindo de futebol. Perguntei sobre a volta de Robinho aos Santos. Ela cortou logo: – Não ouço nenhum programa de rádio sobre esse esporte. Os jogadores nadam em dinheiro, trabalham pouco e ficam sustentando
as marias-chuteiras. E mais, acho uma pouca vergonha ficar ganhando a vida de calçãozinho, com quase tudo de fora. Uma falta de respeito. Eu quero mesmo é que eles quebrem as pernas. Dei um tempo. Retomando a
conversa, falei sobre o dilúvio, mais longo que o de Noé, que vem assolando a cidade de São Paulo, trazendo como conseqüências um grande número de desabrigados, de mortos e a falta de perspectiva de algum alívio. Depois,
perguntei-lhe: – Você acha que estamos caminhando para o fim do mundo?
Mais calma, ela olhou de olhos arregalados para as estantes de livros
que circundavam a sala onde estávamos e ousou responder: – Disso eu não sei nada; nem imagino; mas o senhor, que leu tanto livro pela vida afora, na certa já encontrou alguma resposta e não me fala para eu não ficar
assustada. – Lurdes, eu também não sei. Alguns livros falam sobre sinais
do fim dos tempos, mas é tudo muito difícil de entender. Enquanto
essa hora não chega, vamos viver. E, ao ouvir falar em vida, emendou logo uma pergunta: – O senhor vai votar em quem para entrar no lugar de Lula? Fiz
sinal com os braços, cabeça e rosto que não sabia ainda. – Pois eu já sei, disse ela com firmeza. Só votaria se pudesse ser no Lula. Mas na mochila de Lula não voto por lei nenhuma. Também não voto no Serra, porque ele é muito feio. Estou sem candidato

Luiz Viegas de Carvalho